sexta-feira, 11 de maio de 2012

Fogos de inverno e conservação da natureza na Serra de Montesinho

Por: João Azevedo, Felícia Fonseca,
Paulo Cortez e Maria Alice Pinto

CIMO – Centro de Investigação de Montanha, ESA,
Instituto Politécnico de Bragança
Fotos:P.Ferro

Um incêndio consumiu cerca de 900 ha de matos no planalto da Serra de Montesinho nos últimos dias de Fevereiro de 2012. O fogo teve origem em Espanha (Calabor) tendo progredido para o território português onde acabou por consumir uma área considerável durante dois dias.

Os fogos de inverno são habitualmente de baixa intensidade/severidade e consomem áreas pequenas. Considerando adicionalmente a época do ano em que ocorrem, estes fogos não têm usualmente impactos negativos muito significativos na flora, fauna, solo ou água. Em muitos aspetos são mesmo positivos. Permitem reduzir o risco de incêndio uma vez que criam descontinuidades na vegetação permitindo reduzir a intensidade, velocidade e área ardida dos fogos que venham a ocorrer no verão. Contribuem ainda para a dinâmica de processos importantes para os ecossistemas e para a biodiversidade como o aumento da mobilidade de nutrientes na paisagem e a criação de áreas abertas utilizadas por diversas espécies da fauna e da flora, incluindo as espécies domésticas.

As condições meteorológicas em que decorreu o fogo na Serra de Montesinho foram algo anormais para esta época do ano. A precipitação foi muito baixa em Janeiro e praticamente nula em Fevereiro e a temperatura máxima do ar aumentou subitamente no final de Fevereiro ultrapassando os 20ºC em Bragança. A vegetação viva e o solo apresentavam assim humidade muito baixa. Adicionalmente existe nesta parte da Serra de Montesinho uma quantidade considerável de biomassa morta de plantas anuais e vivazes. Nestas condições, o fogo liberta muita energia e propaga-se rapidamente. O comportamento do fogo foi ainda influenciado por ventos fortes que se fizeram sentir durante estes últimos dias de Fevereiro, particularmente durante a noite.

Apesar das condições meteorológicas excepcionais em que decorreu, o fogo de Montesinho teve, em geral, um intensidade/severidade baixa relativamente à que poderia ter tido se tivesse ocorrido no verão. Consumiu uma área grande e por isso tem um impacto visual muito elevado após o incêndio. Apesar de não termos feito uma avaliação no local, prevemos que os impactos ecológicos sejam pouco significativos. A flora não deve ser afetada devido às estratégias que as plantas adotam em áreas de altitude como estas, evitando estar ativas no inverno quando a temperatura do ar atinge valores muito baixos. Os animais nesta época do ano também não são tão vulneráveis por serem mais móveis. A estrutura do solo foi afetada à superfície mas pelo facto de o relevo ser pouco acidentado e porque em Março e Abril deste ano a precipitação foi escassa, não devem ocorrer perdas muito significativas de solo ou cinzas por erosão hídrica. Podem ocorrer, contudo, perdas por erosão eólica. Como o fogo não chegou à área de drenagem da barragem da Serra Serrada a qualidade da água superficial não deve ser afetada. Os impactos negativos mais significativos deste incêndio, no nosso entender, para além do impacto visual já referido, são a libertação de carbono para a atmosfera e a eliminação da heterogeneidade da paisagem criada naturalmente ao longo dos últimos anos nesta área. Achamos, contudo, que esses impactos são temporários e poderão ser anulados num período de 2 a 3 anos. Houve ainda um impacto económico negativo deste incêndio por ter implicado custos no seu combate.

Achamos que este fogo na Serra de Montesinho, apesar da sua dimensão e forte impacto visual imediato, terá efeitos negativos negligenciáveis na fauna, flora, solo e água mesmo tendo ocorrido em condições quase extremas para esta época do ano. Os efeitos de um fogo desta dimensão durante o verão teriam sido consideravelmente superiores aos que prevemos que ocorram neste caso.

Os fogos de inverno são importantes para a manutenção do mosaico paisagístico em áreas de montanha e assegurar o funcionamento ecológico destes territórios. Tal é particularmente relevante num período em que estas áreas se alteram rapidamente por redução ou abandono das atividades humanas. Na aldeia de Montesinho, por exemplo, já não há rebanhos e a perturbação humana nos ecossistemas da Serra é atualmente muito baixa. Este abandono favorece a acumulação de cargas muito elevadas de combustíveis em grandes extensões criando assim condições para a ocorrência de fogos de grande severidade no futuro e com fortes impactos nos ecossistemas e na biodiversidade. Muitas das áreas afetadas por este processo foram classificadas nos anos 70 pelo Estado português como áreas de conservação da natureza devido ao valor natural e cultural da paisagem. A manutenção da heterogeneidade dessa paisagem e das condições que levaram à sua classificação na ausência de perturbação humana fá-las depender cada vez mais da ocorrência de fogos de inverno. Tal não significa, no entanto, que se defenda a proliferação indiscriminada e desgovernada de fogos de inverno. Tal seria igualmente crítico em termos ambientais, com tendência a piorar no futuro com a acumulação de efeitos e ainda como resultado de alterações climáticas. O desejável seria a condução de fogos de inverno em condições controladas que permitissem criar um padrão mais ajustado aos objetivos de conservação desta área reduzindo simultaneamente o risco de incêndios de verão. A técnica é conhecida e aplicada em muitas regiões do mundo com elevado sucesso e Portugal dispõe de técnicos qualificados para o seu uso. Existem assim condições para a implementação de esquemas de fogo controlado nesta área pelos motivos já enunciados mas também como forma de reduzir os custos associados à supressão do fogo que são tanto mais elevados quanto mais dependem do combate e menos da prevenção.

Um incêndio consumiu cerca de 900 ha de matos no planalto da Serra de Montesinho nos últimos dias de Fevereiro de 2012. O fogo teve origem em Espanha (Calabor) tendo progredido para o território português onde acabou por consumir uma área considerável durante dois dias.

Os fogos de inverno são habitualmente de baixa intensidade/severidade e consomem áreas pequenas. Considerando adicionalmente a época do ano em que ocorrem, estes fogos não têm usualmente impactos negativos muito significativos na flora, fauna, solo ou água. Em muitos aspetos são mesmo positivos. Permitem reduzir o risco de incêndio uma vez que criam descontinuidades na vegetação permitindo reduzir a intensidade, velocidade e área ardida dos fogos que venham a ocorrer no verão. Contribuem ainda para a dinâmica de processos importantes para os ecossistemas e para a biodiversidade como o aumento da mobilidade de nutrientes na paisagem e a criação de áreas abertas utilizadas por diversas espécies da fauna e da flora, incluindo as espécies domésticas.

As condições meteorológicas em que decorreu o fogo na Serra de Montesinho foram algo anormais para esta época do ano. A precipitação foi muito baixa em Janeiro e praticamente nula em Fevereiro e a temperatura máxima do ar aumentou subitamente no final de Fevereiro ultrapassando os 20ºC em Bragança. A vegetação viva e o solo apresentavam assim humidade muito baixa. Adicionalmente existe nesta parte da Serra de Montesinho uma quantidade considerável de biomassa morta de plantas anuais e vivazes. Nestas condições, o fogo liberta muita energia e propaga-se rapidamente. O comportamento do fogo foi ainda influenciado por ventos fortes que se fizeram sentir durante estes últimos dias de Fevereiro, particularmente durante a noite.

Apesar das condições meteorológicas excepcionais em que decorreu, o fogo de Montesinho teve, em geral, um intensidade/severidade baixa relativamente à que poderia ter tido se tivesse ocorrido no verão. Consumiu uma área grande e por isso tem um impacto visual muito elevado após o incêndio. Apesar de não termos feito uma avaliação no local, prevemos que os impactos ecológicos sejam pouco significativos. A flora não deve ser afetada devido às estratégias que as plantas adotam em áreas de altitude como estas, evitando estar ativas no inverno quando a temperatura do ar atinge valores muito baixos. Os animais nesta época do ano também não são tão vulneráveis por serem mais móveis. A estrutura do solo foi afetada à superfície mas pelo facto de o relevo ser pouco acidentado e porque em Março e Abril deste ano a precipitação foi escassa, não devem ocorrer perdas muito significativas de solo ou cinzas por erosão hídrica. Podem ocorrer, contudo, perdas por erosão eólica. Como o fogo não chegou à área de drenagem da barragem da Serra Serrada a qualidade da água superficial não deve ser afetada. Os impactos negativos mais significativos deste incêndio, no nosso entender, para além do impacto visual já referido, são a libertação de carbono para a atmosfera e a eliminação da heterogeneidade da paisagem criada naturalmente ao longo dos últimos anos nesta área. Achamos, contudo, que esses impactos são temporários e poderão ser anulados num período de 2 a 3 anos. Houve ainda um impacto económico negativo deste incêndio por ter implicado custos no seu combate.

Achamos que este fogo na Serra de Montesinho, apesar da sua dimensão e forte impacto visual imediato, terá efeitos negativos negligenciáveis na fauna, flora, solo e água mesmo tendo ocorrido em condições quase extremas para esta época do ano. Os efeitos de um fogo desta dimensão durante o verão teriam sido consideravelmente superiores aos que prevemos que ocorram neste caso.

Os fogos de inverno são importantes para a manutenção do mosaico paisagístico em áreas de montanha e assegurar o funcionamento ecológico destes territórios. Tal é particularmente relevante num período em que estas áreas se alteram rapidamente por redução ou abandono das atividades humanas. Na aldeia de Montesinho, por exemplo, já não há rebanhos e a perturbação humana nos ecossistemas da Serra é atualmente muito baixa. Este abandono favorece a acumulação de cargas muito elevadas de combustíveis em grandes extensões criando assim condições para a ocorrência de fogos de grande severidade no futuro e com fortes impactos nos ecossistemas e na biodiversidade. Muitas das áreas afetadas por este processo foram classificadas nos anos 70 pelo Estado português como áreas de conservação da natureza devido ao valor natural e cultural da paisagem. A manutenção da heterogeneidade dessa paisagem e das condições que levaram à sua classificação na ausência de perturbação humana fá-las depender cada vez mais da ocorrência de fogos de inverno. Tal não significa, no entanto, que se defenda a proliferação indiscriminada e desgovernada de fogos de inverno. Tal seria igualmente crítico em termos ambientais, com tendência a piorar no futuro com a acumulação de efeitos e ainda como resultado de alterações climáticas. O desejável seria a condução de fogos de inverno em condições controladas que permitissem criar um padrão mais ajustado aos objetivos de conservação desta área reduzindo simultaneamente o risco de incêndios de verão. A técnica é conhecida e aplicada em muitas regiões do mundo com elevado sucesso e Portugal dispõe de técnicos qualificados para o seu uso. Existem assim condições para a implementação de esquemas de fogo controlado nesta área pelos motivos já enunciados mas também como forma de reduzir os custos associados à supressão do fogo que são tanto mais elevados quanto mais dependem do combate e menos da prevenção.
O cbbraganca fica imensamente grato aos autores deste artigo pela amabilidade e  disponibilidade na elaboração deste artigo.


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