quarta-feira, 25 de agosto de 2010

«Houve algum laxismo» no combate aos incêndios

Hermínio da Silva Botelho é investigador do Grupo de Fogos Florestais da Universidade de Trás-os-Montes e colabora num projecto europeu pioneiro denominado "Paradoxo do fogo". O docente analisa o que tem sido feito na prevenção e no comnate aos incêndios, apontando o dedo a algum «laxismo» no combate ao problema.

Depois de em 2003 a área ardida em Portugal ter disparado para mais de 300 mil hectares, corre-se o risco de este ano chegarmos aos 100 mil hectares, segundo as previsões, voltando o País a contabilizar a maior área ardida dos últimos anos. Como analisa estes dados à luz dos investimentos que têm sido realizados nesta área?
-Há vários factores que explicam esta situação, mas basicamente, penso que não tem sido feito tudo na prevenção. É que quando falamos de prevenção, não se trata apenas da prevenção clássica ao nível da silvicultura, mas também em termos da acumulação de biomassa, e o que se verifica é que muitas áreas ardidas não foram limpas. Isto quando já se sabe que é mais que provável que aconteçam fogos.
O sistema de combate está mais refinado, tem maior capacidade de intervenção, mas penso que houve algum laxismo, o que é normal quando não se veríficam casos gravosos nos últimos anos. Por outro lado, qualquer sistema colapsa quando confrontado com muitas ocorrências em simultâneo. Penso que temos de discutir de novo a forma de coordenação dos meios no terreno. Por exemplo, as equipas de intervenção não foram utilizadas como deviam, pois notei que demoravam muito tempo a chegar ao terreno.
Só quando admitirmos que não temos capacidade de gerir a bimoassa nas florestas e terreno adjacentes é que poderemos avançar em matéria de prevenção e combate aos incêndios.

O MAI atribuiu as culpas destes números às condições climátéricas. Acha que este factor foi preponderante no cenário dos incêndios em Portugal?
-Teve a sua cota de importância. Mas antes de atribuir «culpas» temos de analisar se os Planos Municipais de Defesa da Floresta foram cumpridos, se as câmaras municipais fizeram cumprir a legislação correctamente e que tipo de intervenções foram feitas pelos proprietários e outras entidades nos terrenos.

O que acha que deve ser feito ao nível da prevenção de incêndios? Já defendeu a utilização de câmaras de videovigilância e torres de vigia. Como acha que estas ferramentas podem ser eficazes?
-Isso não é prioritário, até porque se verifica que são as denúncias feitas por pessoas que mais rapidamente assinalam ocorrências de incêndios. Primeiro temos de perceber porque arde a floresta. Se cuidarmos da floresta, os focos de incêndio não chegam a ter proporções como chegámos a ver este ano. Ora, temos de trabalhar mais na prevenção, o que se calhar implica uma mudança radical.

A UTAD está a desenvolver um projecto pioneiro a nível europeu nesta área. Pode explicar do que se trata?
-Chamámos-lhe o Paradoxo do Fogo. A ideia que temos é quase oposta à política de combate dos incêndios: combater o fogo através do fogo. Em áreas estratégicas, por exemplo, conseguimos travar incêndios queimando, usando fogo controlado, áreas adjacentes. É uma técnica inovadora na Europa, mas já praticada noutros países como Estados Unidos, ou América do Sul. Basicamente o projecto serviu para angariar informação sobre esta matéria e preparar técnicos.
Autor / Fonte Lúcia Duarte
Foto:PFerro

Sem comentários: