De regresso a casa, onde recupera do fatídico acidente do passado dia 14 de Junho, Ricardo Mieiros não esquece quem esteve ao seu lado naqueles momentos difíceis em que lutou contra a morte. “Agradeço aos meus colegas, ao comandante dos Bombeiros Novos de Aveiro, aos meus colegas, amigos e familiares, pela disponibilidade e ajuda que me deram quando estive internado em Espanha”, refere. As palavras saem embargadas, quando tem de recordar a tragédia. “Não consigo lembrar-me de quase nada. Aliás, tudo o que sei sobre o acidente é o que tenho lido na Internet, porque, desde que entrei em coma, não me recordo de praticamente nada”, confessa.Recordar o momento trágico, que roubou a vida a um dos seus melhores amigos, são lembranças muito amargas e difíceis de esconder. “Sei que vinha a conduzir quando parámos numa área de serviço. Sentia-me cansado. Tomámos o pequeno-almoço, soltámos os cães e começou a chover. Regressámos à ambulância e passei para trás, para junto do Carlos Macieira (n.d.r.: bombeiro que faleceu), para descansar. Começámos os dois a ver fotografias e a rir. Depois...”. O relógio marcava 6.40 horas, quando, por causas que ninguém conseguiu até agora explicar, ocorreu o acidente. “Era uma estrada longa, sem casas na berma. Nada! Deserto autêntico. A ambulância capotou e andámos aos trambolhões. Sei que fomos cuspidos. O chefe Rui Silva disse-me que eu olhei à minha volta e caí para trás”, conta o aveirense. Nesse momento, Ricardo Mieiros teve a primeira paragem cardio-respiratória. Sorte, foi que atrás vinha um automóvel, espanhol, que assistiu ao acidente e contactou a emergência. “Foi, de facto, a nossa sorte. Num ápice, quatro ambulâncias, um helicóptero, e dois carros da Guarda Civil estavam junto de nós. Foram espectaculares”, conta Ricardo.
À entrada para o hospital de Santas Martas, em Leon, o coração de Ricardo Mieiros voltou a sucumbir. Mas, agora, estava em boas mãos. Foi-lhe induzido o coma profundo, estado em que se manteve durante seis longos dias. “Entrar em coma é adormecer e não lembrar de nada. Fala-se que se vêem luzes, sonhos, túneis com um clarão, tanta coisa…, no entanto, depois de acordar, não me lembro de nada. Adormeci, e pronto”, explica. No dia 26 de Junho, pelas 16 horas, Ricardo acordou. A seu lado estava a namorada, que permaneceu duas semanas consigo, “sem ajudas do Estado, apenas dos bombeiros”, sublinha. Ao princípio, Ricardo Mieiros não reconheceu ninguém. “Estava confuso. Perguntaram-me onde estava e eu respondi que me encontrava no hospital. Percebi que algo de grave se tinha passado. Mas não sabia bem o que era”, recorda.Depois, foi o começo da recuperação. Ainda permaneceu em Leon, no quarto do companheiro de jornada, José Ribeiro, e só mais tarde é que lhe deram a pior notícia que poderia esperar – a morte do amigo Carlos Macieira. “Esperaram algum tempo para me dizerem que o Macieira tinha falecido. Fiquei em choque e bastante triste. Ainda hoje me custa a acreditar”, diz.De volta a Portugal, começou o longo período de recuperação física e psicológica. Actualmente ainda sente algumas dificuldades. “Tenho uma das pernas ainda dormentes”, confessa. “Custa-me dobrar os braços e tenho muitas dificuldades para adormecer. Mas já não tomo qualquer medicação”, regozija-se, apesar de ainda se sentir confuso.É como se tivesse renascido. Ricardo Mieiros não vê a hora de regressar aos bombeiros. “Talvez em Setembro. De vez em quando, vou até lá. O que eu quero mesmo é regressar à normalidade, continuar na Equipa de Buscas e Salvamento, juntamente com a minha cadela Kika”, desabafa, já com um sorriso.Família, amigos, Internet, televisão, “muita força de vontade, e telefonemas”, são a sua companhia. Daqui a alguns dias, “Rica”, como é carinhosamente tratado pelos amigos, deverá estar de regresso à vida activa para fazer o que mais gosta: ajudar o próximo. “E quero muito voltar a Barcelona, para o ano que vem, e fazer novamente o curso de formação de cães de busca e salvamento. Se sobrevivi foi por isso”, concretizou...
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